Friday, March 30, 2007

 

Quase Humano




Já haviam passado os trinta minutos iniciais de hoje, o sono me rendia. A televisão, programada na função sleep, transmitia “Bola da Vez”, do canal ESPN Brasil, programa de entrevistas quinzenal, aos moldes do consagrado Roda Viva da TV Cultura, em que o entrevistado – sempre um destacável descartável do universo esportivo (no caso da filial brasileira da network dedicada aos esportes) - é posto sentado no centro do estúdio, enquanto afáveis inquiridores ficam dispostos ao longo de uma larga bancada de forma semicircular. No Roda Viva, a bancada apresenta diferentes níveis e a sua circunferência é completa - uma estrutura mais complexa, assim como aparentam ser, via de regra, os entrevistados e os temas que eles suscitam, na sisuda Cultura, de São Paulo. De modo que a atmosfera no estúdio desta última é intimidadora, enquanto que na primeira é intimista.

A bola da vez era Edmundo. Bolei. Minha reação imediata foi determinar mais 120 minutos de acréscimo ao controle que cronometrava meu sono. Dentre as 99 emissoras disponíveis no plantel da NET digital, desconheço outra que ofereça entrevistas tão reveladoras quanto a ESPN Brasil com esta atração que aqui se está por comentar.

Edmundo, por sua vez, é um personagem por demais interessante. Ícone másculo-futebolístico, símbolo de uma Era, os anos 90, pródiga em polêmicas dentro e fora dos gramados e que, quando parecia sucumbir ao crepúsculo profissional, fez como Balboa e ressurgiu no papel de astro do clube que assim o consagrara quase quinze anos antes. Imperdível.

O Animal apresentou-se completamente domesticado quando confrontado com o fogo; por vezes amigo, por outras nem tanto. Estava um primor de civilidade, esbanjava boa vontade, educação, aparentava realmente estar gostando daquela experiência que o expunha a ter de desenvolver as mais variadas respostas sobre assuntos notórios e desagradáveis de sua vida. E Ed se saia com as palavras o craque que é com os pés, extremamente desenvolto e articulado, sem quase nunca cair na tentação de fornecer a resposta mais trivial, expediente ao qual os futebolistas recorrem de modo quase unânime.

Edmundo passou sua vida a limpo, mostrou-se de peito aberto, uma pessoa complexa, humana, amadurecida. Revelou fazer análise. Em determinado momento proclamou: “As pessoas hoje em dia estão se preocupando apenas em ter e esquecendo do ser, que é o que forma o Ser Humano”, parecia Walter Salles.

Até que, já aos 47 do segundo tempo, o âncora João Palomino, prestes a encerrar o programa, lembrou-se de uma última pergunta acompanhada de um leve sorriso irônico:

- E vamos encerrar esta entrevista com a trilha sonora pedida pelo entrevistado. Me diga Edmundo, daonde surgiu o seu gosto por Charles Brown Júnior??

O atacante, com brilho nos olhos, respondeu:

-Me identifico totalmente com as letras do Chorão. Me dá até vontade de chorar com elas. Parece até que ele escreveu pra mim.

Que mongolóide é este Edmundo.

Wednesday, March 28, 2007

 

C.R.E.A.M



Após zipar o sensacional “Doctor´s Advocate”, do The Game e transferi-lo para o MP4, reparei que as melhores músicas do álbum, conforme me informava o vizor do aparelho, eram produzidas pelo mesmo nome: Scott Torch. Me chamou a atenção a moral deste até então desconhecido com o gangsta rapper de L.A, que tece, em inúmeras oportunidades ao longo da referida obra, loas às batidas manufaturadas por Scott.
Até que ontem, conforme a postagem abaixo revela, me foi sugerido por um fã auscultar o mais recente lançamento de Method Man, que atende pela alcunha de “4:21.... The Day After”. Pensava eu tratar-se apenas de mais um Wu Tang caça níquel, visto que o coletivo nova iorquino tem por hábito lançar produções de forma sucessiva e ininterrupta, sendo muitas de qualidade duvidosa. Estava errado. A soberba me subiu a cabeça. “ 4:21...” é um achado, uma relíquia Shaolin que, em seus melhores momentos, relembra o frescor afiado apresentado pelo octeto de Long Island em sua inaugural obra-prima “Enter the Wu Tang (36 Chambers)”. A propósito, qual nome surgia do minúsculo monitor embutido no reprodutor de MP4 identificando quem era o produtor do disco de Method Man?

Se tiver disposição, aqui vai o perfil que saiu na Rolling Stones do mais novo Midas multimilionário produtor de Rap, Scott Storch. Branco, pupilo de DRE, pegava a Paris Hilton, maconheiro compulsivo, mora numa mansão na Florida de U$ 16 milhões, com Iate no cais e Ferraris na garagem.

Tuesday, March 27, 2007

 

Dialética Wu Tang

Ou do porquê o mundo precisa começar a tomar ciência acerca do materialismo bling bling, gangsta, east coast etc....

Denis, o neojornaliso deslumbrado blasona sua mais nova empáfia:

- Um som fuleiramente gangsta, que vos tanto apreciam, é legal de vez em quando, papo de crunk , dirty south, Big Tymers, Master P, Three Six Mafia esses baratos.
Mas eu cada vez mais me aprofundo na linha tamempi, doavi , playsson e de beats sofisticados ao extremo (como diria o gagá jorge, o ben jor).
Mas uma batida THUG é essencial pra virilis de qualquer sujeito homem. Afinal, não sou filho do comédia, tá ligado?
Por isso, uma dica: sê thug , mas sê thug com styla.
Uma dica, do blog só pedrada, é baixar o novo do Method Man.
Essa cara é bom. O Jonnhy sabe... Parada nossa.

http://sopedrada.blogspot.com/

Russo, a versão branca, magra e nipo-brasileira wannabe de Old Diry Bastard reage, aos regurgitos, de Floripa:

- Caralho. O Denis me escreve um e-mail cheio de firula pra me dizer no final que o method man é bom.
Na moral, com todo o respeito Denis, mas ti toma no cú, né nemzoca.
Porra, eu esperando algo novo que ia mudar a minha vida cultural e o cara me aparece com um viciado em crack.

Este cá, desocupado crônico (com tempo de sobra para elaborar um e-mail longo e estruturado a ser enviado para os referidos camaradas) e catedrático das irrelevâncias que orbitam a galáxia do rap:

- Method é a personificação do negro insolente, preguiçoso, arredio, avesso ao trabalho formal, com a constituição inata - uma herança ancestral- propensa a passar a vida degustando fumos que apresentam alto teor THagáCítico e ser um fuckin´porra louca. Esta é a sua natureza, daí o seu "character" ser tão popular, pois Method é fiel à sua essência.
Ainda assim o meu Wu Tang predileto é o Raekwon, que, com Ghostface Killa, forma o duo mais cascudo a.k.a Ruffneck, ignorante, estúpido, arrogante e grosseiro de todo o cosmo de New York State of mind. Raekwon é uma bola preta de banha e músculos, um boxeur de alma, que com seu fale suave de rimas deslizantes mais acentuadamente malandro que já tive notícias, flutua pelas ondas sonoras do estéreo como uma borboleta pra, numa unidade tempo centesimal, te picar como uma abelha, como diria o maior negro de todos os tempos, Muhammad Ali.

M-E-T, H-O-D, MAN
M-E-T, H-O-D, MAN

I got, fat bags of skunkI got/
White Owl blunts/
And I'm about to go get lifted/
Yes I'm about to go get lifted

I got, myself a fourty/
I got, myself a shortyA/
nd I'm about to go and stick it/
Yes I'm about to go and stick it

Friday, March 23, 2007

 

Missouri


Não tenho a menor idéia de qual seja o significado de “Mzuri Sana”, nome de um trio de hip hop paulista (representante da vertente “consciente” do gênero). Ainda que a resposta esteja a um clique no Google, me apraz pensar que se trata de uma esquisita reunião dos nomes de um pouco expressivo Estado Norte Americano, escrito de forma estilizada – Missouri - com o de uma micro cidadezinha (se tanto) no interior fluminense, o Sana, tradicional refúgio de bichos-grilos .

Algo concebido durante uma partida de adedanha entre os integrantes do grupo, que ao se depararem com as respostas dadas na categoria CEP, vislumbraram uma associação entre dois locais tão improváveis.

O que me remete a mais uma enigmática relação geográfica & esotérica estabelecida por outro trio musical em suas letras, mas agora de trip-hop, o Massive Attack, com seu mântrico “Karmacoma, Jamaica and Roma”. A intangibilidade dos mistérios que rondam o ultra-complexo cosmo musical do novo milênio....

De qualquer forma, apesar de não alcançar nem de longe o genial poder hipnótico dos loops ocultos com multi-texturas produzidos pelo conjunto do Ataque Massivo de Bristol, o mais novo lançamento do Mzuri, “Ópera Obliqua” é um sopro de inovação para o rap feito no Brasil.

Na verdade, poderia dizer que “Ópera”, até certo ponto, não passa de uma obra bufa (ou apenas de um bufo, já que falamos de sopro) se levar em consideração a prosódia monocórdia emitida pelos MC´s do trio, muito comum entre rappers de São Paulo. Ao longo de quase todo CD, ouve-se sempre o mesmo flow inflexível e engessado, o que é uma pena ao se considerar que a produção das batidas e densidade das rimas excedem em originalidade e qualidade, com folgas, a média do que é feito por estas bandas.

Paulistas deveriam ser proibidos de cantar rap, por mais paradoxal que possa parecer, dado que o ritmo no Brasil é completamente identificado com a cidade de São Paulo, sendo indissociável do “mano” da periferia paulista, figura folclórica que chega às raias de, por vezes, arrogar para sí o monopólio do “movimento”. Mas essa questão são outros quinhentos, com perdão da quase rima...ainda assim, fato é que, por existir algo como a fluência do sotaque carioca, notoriamente o mais musical de toda lusofonia, a audição de um robótico emissor de “tÊatro,” “futÊbol” e “adÊvogado” faz-se por demais entediante.

De qualquer forma, pela qualidade técnica e, principalmente, literária de “Opera Obliqua”, o Mzuri Sana merece ser destacado no obtuso cenário do rap brasileiro.

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